May - 20 - 2017

Só a mobilização dos trabalhadores e da juventude pode ser a pá de cal no governo reacionário

Com a publicação da gravação da conversa nada republicana do Presidente da JBS (maior frigorífero nacional), Joesley  Batista, com Michel Temer abre-se uma conjuntura política explosiva que congela momentaneamente as contrarreformas, pode levar a queda do governo e reverter a correlação de forças conjuntural desfavorável para os trabalhares, claro que tudo isso a depender da capacidade da mobilização do movimento de massas nos próximos dias.

O vazamento compromete de maneira incontornável o governo Temer. Em primeiro lugar porque o “ilegítimo” encontra-se com um empresário que está sob investigação por ser beneficiário dos esquemas de corrupção que envolvem os fundos de pensão, conversa que ocorre fora da agenda oficial e em condições sórdidas – o empresário revela nas gravações até que havia entrado pela “pelas portas do fundo” (garagem) do Palácio do Jaburu (Residência Oficial).

Nesse cenário em com personagens típicos de tramas mafiosas o enredo não poderia ser outro senão o de como a classe dominante e seus agentes políticos se movimentam para se defender quando são investigados os seus mega esquemas para amealhar dinheiro público a fins de turbinar os lucros de determinados grupos e o enriquecimento de seus agentes políticos.

Batista, que está fazendo acordo de delação premiada com os promotores da Operação Lava Jato, grava a conversa com o objetivo de coletar provas do envolvimento direto de Temer nos esquemas de corrupção. Durante essa conversa Batista narra que fez gestões para destituir Anselmo Henrique, procurador da república, corromper dois juízes e plantar um procurador (Angelo Villela, preso nessa quinta-feira pela Polícia Federal) para se safar das investigações, informações e práticas que são avalizadas por Temer. Além disso, outro ponto alto da conversa é quando Temer diz que “tem de manter isso, viu?” diante da informação de Batista que está tratando de manter o pagamento milionário de propinas para comprar o  silêncio de Eduardo Cunha (ex-presidente da Câmara dos Deputados).[1] Como se vê, Temer é pego de forma indisfarçável com a boca na botija e dificilmente poderá se safar de uma renúncia ou de um processo de impeachment.

Após a publicação dessa conversa coloca-se a expectativa de renúncia de Temer. Expectativa de queda imediata frustrada após seu pronunciamento na tarde dessa quinta-feira no qual afirma que não irá renunciar, mas ao mesmo tempo que diz que a denúncia “trouxe de volta os fantasmas da crise política ainda de proporção não dimensionada”.

Apesar do tom enfático e irritadiço, o próprio discurso de Temer revela a gravidade da situação criada com a revelação do áudio e deixa transparecer que é sabedor de que será muito difícil se manter no poder. Isso porque a classe dominante e seus representantes no Congresso – que já vinham apresentando fissuras diante da resistência crescente das ruas, de uma profunda recessão e do avanço das investigações que atingem o conjunto da oligarquia política nacional – a partir da revelação desse áudio acaba de se dividir em relação à viabilidade da manutenção de Temer no poder.

Meios de massa apresentam visões opostas sobre a gravação, parte da base aliada rompe com o governo e o STF autoriza a investigação oficial do presidente. Isso tudo porque um presidente ilegítimo, fruto de uma manobra parlamentar reacionária, com índices baixíssimos de popularidade, que enfrenta uma depressão histórica e a mobilização crescente da classe trabalhadora, não tem condições de levar a cabo as contrarreformas que tramitam no Congresso e necessitam de sua sanção. Ou seja, a classe dominante se vê dividida profundamente diante da continuidade do governo Temer ou não a partir da publicação da gravação feita pelo presidente da JBS. E essa divisão cabal da classe dominante era uma das condições políticas estruturais que faltava para derrubá-lo definitivamente e para frear as contrarreformas.

Diante da crise aguda do governo é preciso uma estratégia independente

Em relação à política da esquerda diante de todo esse cenário cabe aqui um breve comentário sobre a posição de defesa da Lava Jato levada por determinados setores da esquerda, notadamente pelos companheiros do MÊS (uma das correntes políticas do PSOL).

É lamentável que os companheiros estabeleçam a seguinte hierarquia causal:  “estamos num momento histórico. Sem junho de 2013 não estaríamos nele. Sem a operação Lava Jato também não”.[2] Nesse argumento político-analítico os companheiros desconsideram que a Lava Jato é uma “força tarefa” operada pela Justiça e pela Política Federal que tem por objetivo estratégico realizar uma espécie de modernização reacionária no Estado brasileiro.

Dizemos modernização reacionária porque pretende que as relações promíscuas entre público e privado sejam alteradas sem a participação das massas populares ou mesmo democratizando de fato os país. Ao contrário, suas lideranças e os setores de massa que se referenciam nela no geral têm orientação neoliberal e propugnam as mesmas contrarreformas de Temer.

Os companheiros do MES desconsideram também que a Lava Jato, apesar da relativa autonomia em relação a oligarquia política tradicional, tem sido totalmente funcional à ofensiva reacionária que passou pelo impeachment de Dilma  Rousseff e que objetiva impor as contrarreformas estruturais, tudo isso a partir da tentativa de impor a correlação de forças Pré-Junho de 2013, ou seja, totalmente desfavorável aos trabalhadores.

Quando os companheiros colocam em pé de igualdade Junho de 2013 e a Lava Jato cometem um tremendo equívoco. Um equívoco que é ao mesmo tempo de concepção e de análise, pois as forças políticas que se desprendem diretamente dos choques entre as classes sociais, mesmo nas condições de semi-rebelião popular ocorridas em Junho de 2013 no Brasil, são criadoras de conjunturas, situações ou etapas politicas transcendentes. Já os movimentos superestruturais de setores da classe dominante ou da alta classe média (base da Lava Jato) não têm essa capacidade politica criativa.

Do ponto de vista da análise mais imediata isso não é diferente, pois foi Junho de 2013 que desestabilizou o pacto social Lulista, responsável em grande medida pelos atuais esquemas de corrupção, e que criou o caldo de cultura para que os Promotores e a Polícia Federal sob interesses políticos ultraconservadores pudessem iniciar as investigações. Assim, a medida em que a polarização social pende a direita, a Operação Lava Jato se estabelece e passa a ser instrumentalizada segundo os interesses da classe dominante.

Mesmo agora, na atual crise, a Lava Jato só pega Temer porque esse tem baixíssima popularidade, a direita perdeu as ruas e a resistência às contrarreformas tornou-se de massa. Dessa forma, não tem cabimento em uma análise concreta e muito menos em uma linha política socialista dizer que “necessitamos defender continuidade da Lava-Jato para desmontar até o final este sistema político corrupto”.[3] Ora companheiros, sabemos que a Lava Jato não tem capacidade para tanto e muito menos esse sentido político.

Essa estratégia – oportunista, digamos – está a serviço de tentar aproximar um setor da classe média abandonando para isso a perspectiva classista, mas é uma linha que não tem fôlego político algum, não pode se demonstrar em nenhum terreno político – nem aqui e nem na China – sob a égide do capitalismo ou do Estado burguês. Significa sim uma enganosa perspectiva que deseduca as novas gerações de militantes ao querer transferir para o Estado burguês e seus agentes uma tarefa contra ele mesmo. Ou seja, varrer o sistema político da corrupção cabe única e exclusivamente à classe trabalhadora, seus partidos e organizações políticas em um processo revolucionário e construtor de uma nova institucionalidade política.

 

Às ruas pelo Fora Temer Já, Eleições Gerais e Constituinte Democrática e Soberana

A partir de agora se embaralham hipóteses de saída política para a crise. A crise de representatividade é tamanha que o instrumento legal seria o de eleger um novo presidente através de eleição indireta pela Congresso Nacional, mas a dúvida é se essa saída seria capaz de estabilizar politicamente o país no atual cenário de forma que a pauta de contrarreformas possa continuar avançando.

Daí que alguns setores estejam defendendo a criação de uma emenda constitucional para que seja possível antecipar a eleição presidencial. Mas a saída através de uma eleição direta não é menos perigosa para a classe dominante à medida em que não restam nomes confiáveis para a classe dominante. Lula, que vinha sendo defenestrado, processado, ameaçado de punição e até de prisão, teria que ser reabilitado, mas isso significaria uma tremenda desmoralização e perda de apoio nos setores que estão à frente da modernização reacionária e o que é pior, o fortalecimento, mesmo que contraditório, da posição dos trabalhadores contra as “reformas”. Assim, a saída parece que tende a se desenhar é através da eleição indireta que coloque no poder um governo ´técnico”.

Nessa situação, em que as condições políticas para a queda de Temer estão mais do que postas, a nossa classe precisa impor desde as ruas os seus interesses. Não há irreversibilidade em situação política alguma, dizemos isso porque a hipótese de resistência e manutenção do governo, diante de um equilíbrio de forças que não acaba de se resolver, não está fechada. Assim, a primeira tarefa continua sendo derrotar definitivamente esse governo e suas contrarreformas, ou seja, o “Fora Temer” e “Nenhum Direito a Menos”. Em segundo lugar, é necessário lutar a fundo para construir uma alternativa política da classe trabalhadora, pois com a possível queda de Temer a burguesia prepara um governo de caráter mais bonapartista, que tenha o caráter “de salvação nacional” e que tenha o aval da classe dominante, do Congresso, do Judiciário e das Forças Armadas para “fazer o que for necessário” para impor as “reformas” e a ordem social.

Dessa forma, pensamos que a nossa luta tem que passar pelo “Fora Temer”, mas não pode, sob risco de perdermos a possibilidade de criar definitivamente uma nova correlação de forças e barrar as contrarreformas, deixar de luta por uma saída política. Saída que a nosso ver passa por “Eleições Diretas”, “Eleições Gerais” e “Assembleia Constituinte Democrática e Soberana” imposta pela mobilização para refundar o país de acordo com  a necessidade dos trabalhadores.

[1] Um dos principais operadores do esquema de propinas em troca de emendas parlamentares e outra vantagens para a grande burguesia age como capo exigindo cada vez mais grana para não delatar todo o esquema.

 

[2] http://esquerdasocialista.com.br/todos-as-ruas-derrubar-temer-e-suas-reformas-contra-corrupcao-eleicoes-gerais-ja/

[3] Idem.

Por Antonio Soler, 19/05/2017

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